ARTIGOS

 

Modificações causadas pela MP nº 927 durante o Período de Pandemia do Coronavírus - 06/04/2020

 

Autoras: Polyanna Pimentel Muniz e Jéssica Maiara C. Pereira

 

Em 11/03/2020, a Organização Mundial da Saúde (OMS) declarou pandemia global ocasionada pelo Coronavírus – COVID 19. A nova doença alterou o dia-a-dia de vários indivíduos devido seu alcance mundial.

 

Diante desse cenário, diversos países adotaram medidas para minimização da doença e no Brasil não poderia ser diferente. Assim, visando a proteção da coletividade, estabelecimentos foram fechados e a recomendação é o recolhimento da população.

 

Neste sentido, com fito de regulamentar as alterações para os trabalhadores e empregadores que são grande parte da composição da sociedade, o governo editou a MP 927. Esta medida está atrelada ao Decreto 6 de 2020 que, fundamentalmente, estabelece medidas em estado de calamidade pública.

 

Mas como este quadro afeta diretamente nas relações de trabalho?

 

Inicialmente, é importante salientar que, pelas circunstâncias episódicas, houve a relativização do princípio protecionista abarcado pela CLT objetivando evitar a extinção dos postos de trabalhos e empresas – assim, na presente conjuntura, verifica-se que o princípio homenageado é o da preservação da empresa (função social da empresa) e do interesse coletivo sobre o individual.

 

Ademais, a medida provisória visa também a flexibilização de obrigações, notificações, formalidades e supressão de encargos estendendo-se a empregados urbanos, domésticos (no que for compatível), rurais, estagiários (no que for compatível) e terceirizados.

 

Além disso, destaca-se que a medida trouxe um aparente conflito de normas vezes indo em sentido oposto ao que dispõem o Direito do Trabalho. Por exemplo, aduz o artigo 2º da MP, que os acordos individuais prevalecem ante as normas coletivas, instrumentos normativos, leis e negociais, desde que respeitado os limites da constituição. Ocorre que tal disposição diverge diretamente com o que dispõe o artigo 611-A da CLT que consagra a preponderância das normas coletivas sobre os acordos individuais.

 

Como mencionado, o princípio protecionista não é o foco abarcado pela MP, mas uma solução provisória ao quadro já instaurado de calamidade ante a pandemia de Coronavírus. O disposto no artigo segundo, mediante ao quadro atual, é plenamente aplicado, vez que os acordos individuais, neste momento, são as medidas que podem garantir as partes medidas satisfatórias.

 

Noutro giro, deve-se observar as condições dos acordos, apesar do que determina o artigo 444 da CLT quanto a livre estipulação, visto a situação é excepcional, pode haver uma fragilidade nas cláusulas pactuadas, pois não foge deste quadro o vício de consentimento posterior.

 

Dentre outras medidas bilaterais que podem ser adotadas pelo empregador se encontram: o pagamento parcelado do salário; alteração de função e atribuições ou da forma de pagamento; suspensão total ou parcial do contrato de trabalho (lay-off); não adiantamento de 50% do 13º salário ou sua postergação de seu pagamento para o ano subsequente; supressão de sobressalário ou de utilidades no período de inatividade ou de teletrabalho etc.; alteração das formas de executar o trabalho (mudança de ferramentas, uso da tecnologia etc);

 

Dentre as medidas unilaterais para enfrentamento dos efeitos econômicos decorrentes do estado de calamidade pública e para preservação do emprego (o teletrabalho; a antecipação de férias individuais; a concessão de férias coletivas; o aproveitamento e a antecipação de feriados; o banco de horas; a suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho; o direcionamento do trabalhador para qualificação; e o diferimento do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS) destaca-se:

 

a) Home Office, Teletrabalho, Banco de Horas e Férias: Dentre os artifícios que podem ser utilizados pelo empregador, o home office ou teletrabalho se demonstram como soluções adequadas neste período. Destaca-se ainda que o artigo 4º da MP estabelece uma forma não concede ao empregado a faculdade de aceitar ou não tal modalidade somente devendo o empregador avisar ao empregado desta condição com 48 horas de antecedência, conforme o §2° do mesmo artigo.

 

 

Aproveita-se a oportunidade para diferenciar o trabalho home office do teletrabalho: o home office ou trabalho à distância é todo o trabalho prestado na residência do empregado ou local escolhido pelo empregador enquanto o teletrabalho, pouco difundido no mercado de trabalho brasileiro, é executado por meio de tecnologia da informática ou telemática, tendo sua regulamentação no artigo 75-A e seguintes da CLT.

 

A MP 927/2020 determina que, por meio de acordo escrito, empregado e empregado determinarão disposições relativas à responsabilidade pela aquisição, pela manutenção ou pelo fornecimento dos equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária e adequada à prestação do teletrabalho, bem como sobre o reembolso de eventuais despesas arcadas pelo empregado.

 

Frisa-se que o tempo de uso de aplicativos e programas de comunicação fora da jornada de trabalho normal do empregado não constitui tempo à disposição, regime de prontidão ou de sobreaviso, exceto se houver previsão em acordo individual ou coletivo.

 

Contudo, caso o empregado não possua os meios tecnológicos e a infraestrutura necessárias à prestação do teletrabalho, o empregador poderá fornecer os equipamentos fornecer os equipamentos em regime de comodato (empréstimo) e pagar por serviços de infraestrutura, porém, na impossibilidade do oferecimento dos equipamentos, o período da jornada normal de trabalho será computado como tempo de trabalho à disposição do empregador.

 

b) Concessão de férias: Em atividades fabris ou em qualquer ramo em que não seja possível a adoção de home office, também seria possível o estímulo à fruição de eventual saldo de banco de horas ou mesmo a concessão de férias, sejam individuais ou coletivas.

 

Em caso de antecipação de férias individuais é imperioso destacar que poderão ser concedidas por ato do empregador, ainda que o período aquisitivo não tenha transcorrido. Contudo, a comunicação deve ser realizada com, no mínimo, 48 (quarenta e oito) horas de antecedência, por escrito ou por meio eletrônico, com a indicação do período a ser gozado pelo empregado – que não poderá ser inferior a 05 (cinco) dias corridos (art. 6º da MP).

 

Destaca-se que o empregador poderá optar por efetuar o pagamento do adicional de um terço de férias após sua concessão, ou seja, a MP autoriza o pagamento do adicional até 20 de dezembro para as férias concedidas durante o estado de calamidade.

 

Quanto aos empregados que não se amoldem as situações supramencionadas, ou seja, que não haja as medidas unilaterais aderidas pelo empregador, de forma bilateral ou sob acordos coletivos ou individuais, a lei 13.979/2020 dispõem que o período em quarentena será tratado como falta justificada sem prejuízo ao salário do trabalhador.

 

Contudo, caso a atividade econômica não resista aos efeitos econômicos decorrentes do estado de calamidade pública a extinção do contrato de trabalho se torna opção.

 

Nesse caso, embora existam outras modalidades de rescisões (justa causa, imotivada, rescisão indireta, dentre outras). No contexto atual, a rescisão do contrato de trabalho poderia ocorrer por motivo de força maior – diante do acontecimento IMPREVISÍVEL e INEVITÁVEL e alheio à vontade do empregador (art. 501 e 502 da CLT). Mas, nesse caso, o que seria devido ao trabalhador?

 

Além das verbas rescisórias (férias vencidas e proporcionais acrescidas do terço constitucional, 13º, 13º proporcional, saldo de salário etc.) a legislação concede ao empregador o pagamento da indenização do FGTS pela metade, ou seja, 20% (art. 18, §2º da Lei 8.036/90), frisa-se que NÃO é devido o aviso prévio, afinal, como supramencionado, o empregador não tinha como prever ou mesmo evitar a ocorrência da força maior.

 

Por fim, é possível que haja a extinção do contrato de trabalho em razão do factum principis (paralisação temporária ou definitiva do trabalho em razão de ato de autoridade governamental), não é devido o aviso prévio e, nessa modalidade, a responsabilidade pelo pagamento da indenização por tempo de serviço seria da autoridade que tomou a medida (art. 486, CLT).